(A novela seguinte aconteceu em Fevereiro, mas por falta de oportunidade só agora fica aqui registada a história)
Foi num lindo dia que 4 aventureiros destemidos se fizeram à estrada em busca da onda perfeita sabe-se lá onde… Porquê nesse dia? Não sei! Mas há coisas do destino e essa para mim foi uma delas.
Meses antes já cansado de várias tentativas defraudadas, ele avançou destemido e disse: “bem vamos lá a marcar na agenda o dia “D”. Pode ser aqui?” Silêncio. “E então neste?” Foi escolhido o dia e o objectivo era surfar a costa oeste, pernoitar em Leiria, com jantarada no restaurante Tromba Rija e nova surfada no dia seguinte de manhã. Esta versão ainda foi estendida a mais uma almoçarada na praia do Jimboniro, frente ao mar num ambiente de serenidade completamente alucinante.
Não é que os spots da surfada não estejam mais que divulgados, mas esta actividade de lazer já tem demasiados adeptos violadores do espírito da cena e verdadeiramente insuportáveis. Por isso os spots serão todos apresentados em versão codificada.
Nayacravich era o 1º objectivo. Conhecido por ter as maiores e mais poderosas ondas do país. Um dos locais de culto para a prática do bodyboard e pouco apreciado pelos surfs, devida à rapidez de formação e cavidade da onda. O handicap deste local é que por ser tão propício às ondas grandes, só se torna surfável naquelas temporadas de pouco swell. Além disso o vento também é um factor importante, que aqui não é nada favorável à predominância do vento de norte português.
Quando me apresentaram um dia “D” como o dia certo para a realização desta mini-surf trip com destino preciso a Nayacravich, tinha quase a certeza que não iríamos. Seria preciso muita sorte para que nesse dia se reunissem condições de vento e swell ideais a uma boa surfada. Por isso optei por nem pedir com antecedência a autorização prévia para sair da gaiola da família.
Mas o insólito aconteceu. Não só o vento e o swell estavam perfeitos, como ainda fomos contemplados com um fabuloso verão de São Martinho em pleno mês de Fevereiro. Nesse dia andamos sempre em calções e durante o piquenique que fizemos na praia tivemos que andar a fugir do sol.
Reunidas as condições às 9 am estávamos nós a partir de Lisboa em direcção a Nayacravich, para a 1ª paragem da nossa surf-trip. Embora o swell estivesse pequeno, não estava muito convencido em surfar neste destino. Normalmente eu sou o gajo mais receoso do nosso grupo, que faz sempre o papel de querer as ondas mais pequenas. No entanto é inevitável a curiosidade de surfar novos spots. E lá me deixei levar…
O ambiente de Nayacravich é qualquer coisa de assombroso. Um areal imenso a perder de vista, sem uma única vivalma. Depois bem lá no fundo, mesmo junto à encosta começamos a vislumbrar as poderosas massas de água a quebrar e deixando para traz leques vaporizados no sabor do off-shore. Sem dúvida, que as condições eram excelentes. Mas não estava pequeno. Mesmo nada. Isto no meu ponto de vista. Claro que para eles o cenário era óptimo. E eu também acreditava que sim, mas mantinha a minha faceta. É como quando nos passam a vida a espicaçar e mesmo assim nós mantemos a nossa postura só para fazer a vontade aos outros. E ali, eu era o ponto de equilíbrio entre os destemidos e os menos afoitos (eu). Este equilíbrio não era assim tão pacífico e quase que dava discussão. Eu já dizia: “Mas para que é que viemos para aqui? No Jimboniro deve estar lindo e com um tamanho muito mais ajustado.” Um dos afoitos que até é o mais Rookie do grupo (também conhecido por Caçula), já se começava a passar e dizia: “Foge que vocês para incentivar um gajo são do caraças…”
É mesmo assim... faz parte da novela e depois de mais umas trocas de palavras lá estávamos nós a surfar. Realmente não estava tão grande como eu imaginava, mas também não estava tão pequeno como se dizia. Ainda por cima, poucos minutos após entrarmos, o mar começou a descer bastante e quando saímos já não passava de metro.
Mas à medida que descia também ficava mais tubular e a última meia hora deu lugar a um despique pelo melhor tubo e melhor wipe out. Isto com direito a sessão de fotos pelo Caçula.
Depois deste desfecho segue-se um “granda” piquenique com panados, bola, pão de Mafra e tangerinas. Excelente! Tudo isto envolto num autêntico cenário de pura natureza. “Fantasticamente” alucinante. Enquanto nos refastelávamos com a comida que se improvisava íamos enchendo os pulmões de lufadas de ar fresco, como que nos revitalizando para o resto que ainda haveria de vir. Terminámos aquela almoçarada ali, simplesmente embasbacados, a desfrutar o calor e o brutal cenário que nos tinha sido presenteado.
Continuámos para Norte. O mar continuava a descer e passámos por uma série de spots com condições razoáveis, mas fracas quando comparadas com o que já tínhamos surfado. Por mim baril, já estava mais que de papo cheio. Para mim duas horas de surf diário deixam-me arrumado, 3 horas em Nayacravich mais que me tratavam para o resto do fim-de-semana (já lá vão os tempos das directas com surfada matinal, uma sandes miserável, nova surfada e mais uma para fechar o dia). Nãaaa…. Estava mais que bem e feliz.
Por isso quando finalmente atracámos em Tinduryan, os 3 estarolas lá estavam mais que animadíssimos para a 2ª surfada e eu ofereci-me logo para fotógrafo de serviço. Que espectáculo ali refastelado na esplanada, a bronzear-me, de câmara em punho, foto aqui, foto acolá… As condições até estavam bastante promissoras quando chegámos, mas entretanto o vento virou e o mar avacalhou por completo. Mesmo assim ainda se apanharam umas boas manobras.
Já todos fora de água terminámos na esplanada reconfortados com um pôr do sol vislumbroso e acompanhados da melhor maneira possível: Super Bock. Lá tenho que rematar com a minha célebre frase: “Cada vez gosto mais de super bock”. Deve ser da idade. E claro que não faltaram os bons cacoetes a rematar. Estava-se tão bem, tão bem, que difícil mesmo foi sair dali.
Já em Leiria e depois de um belo banho lá vamos nós para o 3º spot: “Tromba Rija”. Mesa marcada para as 20:30. Fomos os primeiros a abrir a sala e quase dos últimos a sair. Mas que bela empanturrada que foi. Mas não daquelas tipo enfarta brutos. Nada disso. Para quem conhece o Tromba Rija de Leiria (não outro qualquer), sabe do que estou a falar. Comida com requinte e bem apresentada. Descrevo só um dos pratos de bacalhau: lascas de bacalhau graúdo, sobre uma cama de grelos gratinados em alho e azeite, coberto com 2 batatas a murro bem alouradas, decorado com um fio de vinagre balsâmico em torno do prato e uma folha de hortelã no topo. O resto é mesmo de bradar aos céus: desde de todo o tipo de entradas, às sobremesas, a travessa de frutas naturais, licores e aguardente, enfim tudo.
Depois seguiu-se uma noite mal dormida porque saiu-me o Caçula na rifa do meu quarto e estava com uma gripalhada insuportável, que mais o fazia parecer uma autêntica chaleira. À parte disso às 8.30 lá estávamos de pé para a última surfada desta viagem. Depois de Nayacravich e Tinduryan, restava agora Jimboniro. Foi para lá mesmo que fomos. O swell tinha descido substancialmente e fazia prever uma escassez de ondas. Mas as coisas recompuseram-se e com um offshore de luxo, a perfeição foi a palavra-chave daquele dia. As ondas pareciam desenhos pintados em papel, dada a exactidão da forma como a linha da onda ia quebrando. Um autêntico quadro de esplendor. O único senão era o frio que tinha apertado bastante, também derivado do off shore. Mas a qualidade da surfada enquadrada em mais uma estrondosa paisagem compensou todo o frio.
Para terminar nada melhor que uma grande almoçarada mesmo em frente ao pico ao som de Bob Marley. Quase que me sentia num paraíso tropical. Quando começou a tocar o “Redemption Song” a serenidade que me atravessou o espírito fez-me lembrar um jantar debaixo de um céu estrelado na Phi Phi Island a ouvir aquela mesma música. Foi um final de gala para aquele saudável convívio de fim-de-semana. (até um próximo)